Do cadastro: um exemplar do "Espumas Flutuantes" acaba de passar por aqui, e, com ele, a "Canção do Boêmio", um lindíssimo poema sobre as desesperanças de um coração apaixonado, de um espírito tumultuado, imersos em trevas devido a ausência da amada e que só podem ser dissipadas com sua presença, dando um fim aos seu martírio.
Alguns trechos:
Canção do Boêmio
Que noite fria! Na deserta rua
Tremem de medo os lampiões sombrios.
Densa garoa faz fumar a lua,
Ladram de tédio vinte cães vadios.
Nini formosa! por que assim fugiste?
Embalde o tempo à tua espera conto.
Não vês, não vês?... Meu coração
é triste
Como um calouro quando leva ponto.
(...)
Diz-me o relógio cinicando a um canto
"onde está ela que não veio ainda?"
Diz-me a poltrona "por que tardas tanto?
Quero aquecer-te, rapariga linda."
Em vão a luz da crepitante vela
De Hugo clareia uma canção ardente;
Tens um idílio — em tua fronte bela...
Um ditirambo — no teu seio quente ...
Pego o compêndio... inspiração sublime
P'ra adormecer... inquietações tamanhas...
Violei à noite o domicílio, ó crime!
Onde dormia uma nação... de aranhas...
Morrer de frio quando o peito é brasa...
Quando a paixão no coração se aninha!?...
Vós todos, todos, que dormis em casa,
Dizei se há dor, que se compare à minha!...
(...)
No entanto ainda do Xerez fogoso
Duas garrafas guardo ali... Que minas!
Além de um lado o violão saudoso
Guarda no seio inspirações divinas ...
Se tu viesses... de meus lábios tristes
Rompera o canto... Que esperança inglória...
Ela esqueceu o que jurar lhe vistes
Ó Paulicéia, Ó Ponte-grande, ó Glória!...
Batem!... que vejo! Ei-la afinal comigo...
Foram-se as trevas... fabricou-se a luz...
Nini! pequei... dá-me exemplar castigo!
Sejam teus braços... do martírio a cruz!...